INSS e governo tentam barrar desaposentadoria para reduzir gastos

Publicado em: 12/09/2016

O governo federal está procurando de diversas maneiras reduzir os gastos da Previdência Social no País. O presidente Michel Temer (PMDB) decidiu que vai mandar a proposta de reforma ao Congresso Nacional neste mês, antes das eleições municipais. O projeto visa fixar a idade mínima para se dar entrada na aposentadoria aos 65 anos, tanto para homens como para mulheres. Porém, essa será uma longa negociação. De imediato, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) está tentando barrar a desaposentadoria no Judiciário e no Legislativo.

Em duas frentes, a autarquia previdenciária vem tentando barrar os direitos dos aposentados que retornaram ao mercado de trabalho e continuam contribuindo com o sistema previdenciário brasileiro. O governo sinalizou recentemente que pretende incluir na proposta de reforma da Previdência um regime especial para os aposentados que continuam no mercado de trabalho, no qual os trabalhadores que recebem benefícios e continuam na ativa podem ficar isentos de contribuição mensal ao INSS. Ou seja, a estratégia é a de minar as decisões do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e de diversos tribunais da Justiça Federal brasileira que reconhecem e validam a troca de aposentadoria.

Segundo os especialistas em Direito Previdenciário, o INSS também está solicitando ao STF (Supremo Tribunal Federal) que julgue de forma rápida o pedido de suspensão dos processos de desaposentadoria que estão nos tribunais brasileiros. Esse pedido é uma espécie de pressão do INSS para barrar as vitórias que centenas de aposentados estão garantido nos tribunais por aposentadoria mais vantajosa, pois continuam no mercado de trabalho e contribuindo com o INSS. E essas vitórias vêm sendo reforçadas por um instrumento chamado tutela de evidência, que surgiu em março deste ano, após a aprovação do novo CPC (Código de Processo Civil), explica o advogado João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.

Na visão dos especialistas, essas duas operações demonstram que a autarquia previdenciária, de certa forma, reconhece que os aposentados que continuam na ativa têm esse direito, mas com a desculpa de que existe um deficit na Previdência Social, não quer pagar essas novas aposentadorias.

Segundo a AGU (Advocacia-Geral da União), existem mais de 182 mil ações judiciais em curso no País tratando da troca de aposentadoria o que, segundo a União, pode gerar custo de R$ 7,65 bilhões por ano no deficit da Previdência, e um impacto de longo prazo de R$ 181,87 bilhões.

O advogado Murilo Aith, também sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, no entanto, observa que essa tese da União não é verdadeira. Esses números são desmentidos pela Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal) e reforçados pela tese defendida pela nobre economista e professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Denise Gentil. Segundo a acadêmica, é falso o discurso que diz que a Previdência no Brasil é deficitária. Ela defende que o que está errado não é o modelo atual da Previdência que, apesar da política fiscal caótica do governo, continua gerando superavit. Denise demonstra, ao lado da Anfip, que as receitas da Previdência Social superam os gastos desde 2007.

A economista aponta, por exemplo, que esse superavit foi em 2013 de R$ 67,6 bilhões. Já em 2014, segundo a professora, esses números tiveram queda, apesar de ainda estarem positivos, para R$ 35,5 bilhões. E a estimativa da acadêmica é de que 2015, segundo dados preliminares, seja de superavit de R$ 20 bilhões. Esses dados estão calcados no fato de que o crescimento econômico registrado nos últimos dez anos trouxe a redução da informalidade e o aumento do número de empregos formais, o que alavancou a arrecadação previdenciária.

Dispositivo permite parar processo

O professor e autor de obras de Direito Previdenciário Marco Aurélio Serau Junior explica que o INSS se valeu de um dispositivo, que também entrou em vigor com o novo CPC (Código de Processo Civil), que permite a suspensão de processos em todo território nacional. No caso de o tema estar sob julgamento na sistemática da repercussão geral, como ocorre com a desaposentadoria, o INSS tem o direito de requisitar a suspensão do processo. Esse pedido foi rejeitado pelo STF, embora conte com algum respaldo legal.

Já o professor Gustavo Filipe Barbosa Garcia, doutor em Direito pela USP (Universidade de São Paulo), avalia que a desaposentadoria é figura que ainda apresenta intensas controvérsias. Isso porque, por meio dela, o segurado abre mão da aposentadoria que estava recebendo para requerer nova e diversa aposentadoria em valor mais vantajoso. E, quando se gera ao segurado o direito de recebimento de nova aposentadoria em valor superior ao benefício anteriormente recebido, certamente aumentam as despesas do INSS com o pagamento de benefícios previdenciários, afirma.

Entretanto, o professor também analisa que a desaposentadoria pode aumentar as despesas com benefícios previdenciários, mas não necessariamente acarreta deficit no orçamento da Seguridade Social caso os recursos deste, decorrentes de contribuições sociais para a Seguridade Social, por exemplo, não sejam desvinculados para outras despesas públicas.

VALIDADE – Murilo Aith considera justo que o aposentado que volta a contribuir para a Previdência Social possa desfrutar de seus benefícios e ter sua aposentadoria recalculada, com base nas novas e recentes contribuições. E, segundo ele, os tribunais brasileiros vêm reconhecendo esse direito.

Diversos juízes federais entendem que o aposentado tem direito a um reajuste (alguns chegam a mais de 100%), de acordo com a nova contribuição. E os aposentados não precisam devolver os valores anteriores. Isso está determinado pelo STJ desde maio de 2013, afirma o advogado.

Porém, a validade da troca de aposentadoria precisa ser ratificada
pelo STF. O julgamento poderá ter final ainda neste ano, pelo que sinalizou o ministro Luís Roberto Barroso. O tema se arrasta na Corte Suprema desde 2003. Até o momento, a votação está empatada, com dois ministros favoráveis ao mecanismo e outros dois contrários. No último mês de dezembro, o processo foi liberado para voltar ao plenário. O caso estava suspenso por pedido de vistas da Ministra Rosa Weber, que já devolveu os autos, mas ainda não proferiu seu voto.

Os professores também ressaltam que o momento em que ocorrerá o julgamento é uma prerrogativa do STF, embora não seja adequada essa demora na tramitação que está ocorrendo no caso da desaposentadoria.

Mudança na Previdência pode influenciar na troca de benefício

O cenário que se desenha com as propostas anunciadas pelo governo sobre a proposta da reforma da Previdência Social, que será encaminhada neste mês ao Congresso Nacional, assusta os especialistas.

O professor Marco Aurélio Serau Junior acredita que os efeitos da reforma serão negativos para os segurados do INSS e para quem pretende dar entrada na desaposentadoria. Endurecimento de requisitos para aposentadoria, como idade mínima ou aumento do tempo exigido para contribuição, será um dos principias pilares. Nesse quadro, a desaposentadoria pode sair fortalecida num curto intervalo de tempo, dando a opção de melhor benefício a quem já está aposentado. Porém, em um horizonte mais largo, será inviabilizada, pois já será difícil obter a primeira aposentadoria, avalia Serau Jr.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia concorda e reforça que a tendência geral é de que os requisitos para o recebimento dos benefícios, especialmente das aposentadorias, tornem-se cada vez mais difíceis de serem preenchidos, com exigências cada vez mais rigorosas, o que, naturalmente, pode ocorrer também quanto à desaposentadoria.

Fonte: Diário do Grande ABC (08/09/2016)










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