Justiça Federal tem como meta reduzir o trabalho escravo e o tráfico de pessoas no Brasil

Publicado em: 01/04/2015

Tratar o trabalho escravo como uma página virada da história do Brasil é um erro. A Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, foi, sem dúvida, um passo fundamental para que o Estado brasileiro reconhecesse como ilegal o direito de propriedade de uma pessoa sobre a outra. O problema, no entanto, ainda persiste, embora se apresente de forma diferente da ocorrida até o século 19. Mostra disso são os mais de 8.763 trabalhadores resgatados, em diferentes estados brasileiros, em situação análoga à de escravos, entre 2010 e 2014, segundo dados do Ministério Público Federal (MPF).

Com o objetivo de fazer um trabalho conjunto com o MPF e outros órgãos do próprio Poder Judiciário contra essa prática, a Justiça Federal incluiu em seu Planejamento Estratégico ano 2015–2020, a meta 8. Ela prioriza, em linhas gerais, a celeridade no julgamento de ações penais vinculadas aos crimes relacionados à improbidade administrativa, ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo.

Segundo o juiz federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região Marcelo Albernaz, membro do Comitê Técnico do Planejamento Estratégico da Justiça Federal, o combate à corrupção e à improbidade administrativa já é tratado como prioridade pela Justiça Federal há alguns anos, tendo em vista sua importância para assegurar que os recursos públicos tenham destinação adequada. Porém, ao escolher expressamente o combate ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo, a Justiça reafirma sua vocação para continuar tutelando a liberdade e a dignidade do ser humano, tão afetadas pela prática desses crimes.

“Combater o tráfico de pessoas e o trabalho escravo é importante não apenas por assegurar a punição mais rápida dos responsáveis por esses delitos, mas, principalmente, porque a certeza da punição tende a desestimular a prática de novos crimes da mesma natureza”, afirmou Marcelo Albernaz. Para ele, com a meta 8, a Justiça Federal pretende deixar claro que o Brasil não tolera tais condutas criminosas e pune, em tempo razoável, quem as pratica. “É bom para a sociedade, porque tende a reduzir a criminalidade. É bom para o Conselho da Justiça Federal, porque atende a um anseio da sociedade”, revelou.

Ao explicar como o Comitê Gestor reconheceu que havia a necessidade de incluí-la no Planejamento, Albernaz revelou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já vinha adotando medidas destinadas a tornar mais eficiente o combate ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo, mas que, paralelamente a isso, a Justiça Federal sempre teve consciência da importância de julgar com mais rapidez esses delitos, mas ainda não havia acompanhamento específico de dados para aferir como ocorriam. “A partir da implementação da meta, torna-se necessário seu acompanhamento, permitindo ao Poder Judiciário e à população medir em que nível a aludida priorização está ocorrendo. Daí, a necessidade de incluí-la no Planejamento Estratégico da Justiça Federal”, esclareceu o magistrado.

Número de processos

Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as formas contemporâneas de servidão têm dois elementos básicos: trabalho ou serviço impostos sob a ameaça de punição e aquele executado involuntariamente, sendo que ambos envolvem o cerceamento da liberdade. Isso ocorre no Brasil, em maior parte, em espaços rurais distantes de centros urbanizados e rotas de transporte para fuga, onde os trabalhadores são geralmente coagidos a continuarem laborando sob a alegação da existência de dívidas com fazendeiros.

De acordo com a última estimativa da OIT, realizada em 2014, mais de 21 milhões de pessoas em todo o mundo são vítimas do trabalho forçado. Contudo, o Brasil é considerado referência no combate a esse problema. Em se tratando dos processos em trâmite nos tribunais regionais federais das cinco regiões – referentes ao tráfico de pessoas, ao trabalho escravo e à exploração sexual – somente no TRF1 são 1.287. No TRF2 são, ao todo, 56 processos. Já o TRF3 possui apenas cinco processos. No TRF4 existem 92 em tramitação, enquanto que no TRF5 são 29.

Para a juíza federal Kelly Costa, que atua na Corregedoria-Geral do CJF, essa meta certamente convergirá com ações que buscam objetivos semelhantes de todos os órgãos que atuam na prevenção e repressão de crimes relacionados ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo, entre eles: a Polícia Federal, o Ministério do Trabalho e o MPF. “Essa é uma situação de extrema importância para Justiça Federal. O volume de processo não é grande, mas há grande relevância do tema e o que acontece com as vítimas nesses crimes. O trabalho escravo não é apenas desrespeito a leis trabalhistas. É grave violação aos direitos humanos. Por isso, trouxemos como meta”, afirmou a magistrada.

Ainda de acordo com a juíza federal, quando se trabalha em uma meta como essa há uma intensa colaboração para que outras pessoas não sejam escravizadas. “Espera-se que a implementação dessa meta agilize ainda mais o julgamento dos crimes a que ela se refere, reafirmando o compromisso da Justiça Federal com a tutela da liberdade e da dignidade humana”, falou. A meta 8, portanto, pretende identificar e julgar até 31 de dezembro do ano corrente, 70% das ações penais vinculadas aos crimes relacionados à improbidade administrativa, ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo, distribuídas até 31 de dezembro do penúltimo ano.

“Garantir a melhor aplicação do erário, evitando desvios e desperdícios, com julgamento céleres de questões que envolvam a probidade dos administradores públicos e os crimes contra a administração pública; e preservar os direitos mais básicos dos seres humanos, com a eliminação do trabalho escravo e da exploração sexual, são condições essenciais para se alcançar o aperfeiçoamento da gestão pública de nosso país, e essa será a Estratégia da Justiça Federal para os próximos anos”, assegurou Ivan Bonifácio, secretário de Desenvolvimento Institucional do CJF.

Fonte: CJF (25/03/2015)










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